QUERIDO
AMIGÃO, OBRIGADO POR PARAR DE FUMAR
Por Airton Sousa
Hoje eu
volto a falar sobre o cigarro. Sabe por quê? Porque enquanto pesquisava sobre o
cigarro e seus malefícios encontrei uma carta de 2009. O remetente era
eu mesmo. Como assim, amigão? Não sei, não me pergunte, mas eu achei essa carta
que foi escrita por mim “em 2019” e que eu recebi em 2009. Entendeu? Vamos à
carta:
Dear amigão de 2009
Aposto que quando você ler esta carta
vai estar sentado na frente do computador e fumando um cigarro. E é exatamente
sobre isso que eu queria falar com você.
Você que sempre disse que gostaria de
morrer só depois que o Ryan crescesse, lembra? Pois ele está crescendo e
você/eu estamos morrendo. E sabe por quê? Por causa da porcaria desse maldito
cigarro.
Enquanto você está lendo essa carta, eu
sei, você está tossindo e suas pernas estão doendo. Você não consegue caminhar
até a estação do trem, você não tem mais aquela disposição que tinha, e não é
porque você está gordo. É por causa da droga do cigarro mesmo.
Os primeiros sintomas de que a coisa
estava preta foram aquela tosse, a dor de cabeça e a gastrite. Já eram sinais
de que a nossa saúde estava sendo prejudicada pelo fumo.
Nem vou listar aqui todos os malefícios
do fumo, você/nós sabemos. Lembra quando nós tínhamos 12, 14, 16 anos? A gente
sabia tudo sobre os males do fumo, ganhamos até prêmio como melhor orador na
semana antitabaco da escola. E por que cargas d’água resolveu fumar depois de
velho?
Se você parar agora será para o nosso
próprio bem, o nosso organismo irá recuperar-se dos danos causados pelo
cigarro; em caso dessa doença já estar instalada, vai evitar sua progressão e
melhorar nossa qualidade de vida.
Olha, o Ryan cresceu e tem muito orgulho do vovô; os nossos duzentos sobrinhos também cresceram, já somos tio-avô de vários netinhos. Você conseguiu aposentar-se e morar na praia. Sabe aquele sonho de comprar um terreno imenso e construir oito casas em volta da piscina, uma para cada irmão e cada casa com a plaquinha esculpida com o nome deles? Nós conseguimos! Estamos morando em uma chácara em Angra dos Reis, naquele terreno que você cobiçou a vida inteira, perto da praia. Construímos do jeito que a gente sonhou. Tá pronto e está enorme e todo mundo se reúne em volta da piscina e da churrasqueira quase todos os domingos. Tem até uma capelinha que você construiu para a mamãe orar e não ter que caminhar até a igreja todos os sábados. Falar em mamãe, a velhinha está inteirinha, forte e sadia, só você que não... A casa vive lotada de gente jovem e bonita; são os nossos sobrinhos e os amigos e namorados e namoradas deles.
Mas hoje, especialmente hoje, quando estou escrevendo esta carta para o passado, todos estão tristes. Chegaram os resultados dos exames médicos.
Olha, o Ryan cresceu e tem muito orgulho do vovô; os nossos duzentos sobrinhos também cresceram, já somos tio-avô de vários netinhos. Você conseguiu aposentar-se e morar na praia. Sabe aquele sonho de comprar um terreno imenso e construir oito casas em volta da piscina, uma para cada irmão e cada casa com a plaquinha esculpida com o nome deles? Nós conseguimos! Estamos morando em uma chácara em Angra dos Reis, naquele terreno que você cobiçou a vida inteira, perto da praia. Construímos do jeito que a gente sonhou. Tá pronto e está enorme e todo mundo se reúne em volta da piscina e da churrasqueira quase todos os domingos. Tem até uma capelinha que você construiu para a mamãe orar e não ter que caminhar até a igreja todos os sábados. Falar em mamãe, a velhinha está inteirinha, forte e sadia, só você que não... A casa vive lotada de gente jovem e bonita; são os nossos sobrinhos e os amigos e namorados e namoradas deles.
Mas hoje, especialmente hoje, quando estou escrevendo esta carta para o passado, todos estão tristes. Chegaram os resultados dos exames médicos.
Tudo começou com uma forte insuficiência
respiratória, falta de ar e cansaço. Nós começamos a nos cansar ao menor
esforço físico; e agora, os resultados; e eu nem vou falar o que o médico disse
para não te deixar nervoso, aliás deveria falar, mas você, aliás, nós somos
inteligentes para saber o que vai acontecer. Por isso todos hoje estão tristes.
Muito tristes.
O Ryan está muito bravo com a gente, ele
sempre dizia: “Vô, faça como meu pai: pare logo de fumar.”.
Hoje era dia de festa, mas em vez de
festa há uma ambulância aqui na porta de casa. E você precisava ver os olhinhos
de lágrimas do Ryan, pois é ele quem está digitando esta carta enquanto eu, com
voz fraca, vou ditando para ele.
Pois é, seu grande idiota, vamos passar
uma grande temporada no hospital e não sei se vamos voltar. Os médicos
comentaram que tudo poderia ter sido evitado se você tivesse parado de fumar uns
dez anos atrás.
1 amplexo,
Amigão de 2019.
Esse texto foi escrito em 2009 e publicado no blog “A
turma do Amigão”. Na época eu fumava mais de dois maços de cigarro por dia. Foi
o ano em que o Ryan, meu neto, nasceu. Parei de fumar em 2016, exatamente três
anos antes da data da carta.
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