SAL?
SOU DESSAS!
Denize Vicente – Rio de Janeiro - RJ
Hoje é sexta-feira e você vai ler uma
crônica da Cora Rónai, publicada no seu antigo blog internETC. E depois, eu
duvido que você, de coração aberto, não vá encontrar um jeito de fazer do seu
sábado um dia feliz! Aproveite a vibe e tempere com alegria o sábado de
alguém de perto ou de longe, um amigo ou alguém desconhecido!
Há muitas maneiras de fazer isso. Experimente esse sabor!
Jesus, quando
andou aqui por aqui, disse uma coisa bem interessante. Disse que a gente é o sal
da Terra. E disse mais: se o sal perde o seu sabor não há como restaurá-lo; não
servirá para nada, exceto para ser jogado fora e pisado pelos homens. Imagina
um arroz com feijão sem um pingo de sal! Nem uma pitadinha!
Jesus não
disse, por exemplo, que somos o limão, o jiló, o mel. Também não disse que somos
a prata ou o ouro da Terra. Somos o sal. Pra temperar a vida. Viver uma vida
com sabor, dar sabor à vida de outras pessoas, essa é a missão do homem. E a gente tempera
a vida sendo gentil, sorrindo, sendo grato, agradável, amistoso...
Moisés orientou o povo com a seguinte
instrução: “Tempere com sal todas as
ofertas de cereais, pois o sal representa a aliança que Deus fez com o seu
povo. Toda oferta de cereais deverá ser temperada com sal.” (Levítico 2.13).
Você entende o poder do sal? Nós somos sal. Pra temperar. A própria vida e a dos
outros. Na rua, em casa, no ônibus, no trabalho, na facul, na feira...
Ontem eu levei
sorvete de caqui pros meninos da feira. Eu mesma fiz com os caquis que comprei
na outra semana na barraca deles. Vi um sorriso em cada rosto. E a alegria
tomando conta daquelas vidinhas. A gente é sal, sabe? Pode ser sal insípido,
pode ser sal grosso, e pode ser aquela pitada de sal que vai levar a alegria de
volta a um coração triste, sofrido, cansado... E é como se fossem pequenos milagres, sabe? Jesus era desses. E eu quero poder dizer com
alegria: “Sal? Sou dessas!”.
Jesus no 464 - por Cora Rónai (um
relato da Leila)
"A primeira vez que vi cabras azuis foi da janela do ônibus, indo de casa
para o jornal" — escreveu a Leila num comentário lá do blog. —"Aliás,
muita coisa importante na minha vida aconteceu assim. Foi da janela de um 464
que vi pela primeira vez uma colônia de gatos de rua no parque do Museu Carmem
Miranda.
Foi num 464 que vi Jesus, ele entrou
no ônibus ali na São Clemente, fez alguns milagres e desceu no Catumbi (até
hoje não consigo contar essa história direito, mas aconteceu).
Enfim, lá ia eu para o jornal, tinha
uma obra, acho, o ônibus entrou numas quebradas no Catumbi e lá estavam elas
pastando. Cabras azuis de botinhas pretas! Meu coração disparou, foi amor à
primeira vista.”
Estávamos conversando sobre os bichos
que gostaríamos de ter, mas o que chamou a minha atenção no comentário não
foram as cabras azuis, mas a presença de Jesus num ônibus carioca. Publiquei o
comentário com o merecido destaque. A turma que bate ponto no blog adorou, e
começou a cobrança:
— Leila! Não importa o que você toma,
eu quero dois! — escreveu a Marcela, da Gávea.
— Ou conta a história ou conta o que
você toma! — mandou a Marise.
— É, acho que ônibus é código —
concordou o Tom.
Depois de um suspense de dois dias, a
Leila voltou e respondeu. E todos ficaram muito emocionados, mesmo os incréus,
porque sabemos que a vida tem momentos mágicos:
“Eram umas duas, duas e meia da tarde.
Era um dia bonito, sol sem calor. Morava no Leblon e ia para o trabalho, no
Centro. O ônibus era um 464, acho. O ônibus parou no último ponto antes da
Praia de Botafogo, entrou mais gente, e a voz perguntou ao motorista:
— Comandante, posso pegar uma carona?
A voz era cheia, firme, equilibrada,
mais para o grave, magnífica. Tive que olhar. Era um hippie. Um cara louro,
cabelos no ombro, rosto bonitinho, cabelos mais para o liso, carregava aquelas
coisas de veludo cheias de bijuteria artesanal. Magro, um metro e setenta.
Ah. Ele entrou, tinha um lugar vago,
alguém perguntou:
— Não vai sentar?
— Não, obrigado. Já estou feliz por
conseguir a carona.
Foi só isso, dito por aquela voz,
aquela pessoa. Tudo mudou dentro do ônibus. Um homem levantou e deu o lugar
para uma mulher que estava em pé. Duas moças se ofereceram para segurar
embrulhos de pessoas em pé. Uma pessoa ao lado dele começou a puxar conversa.
Ele respondia com frases comuns, contando de uma vida comum. Atrás de mim duas
senhoras começaram a conversar. Ao lado as pessoas sentadas começaram a
conversar.
Aqui começa a ser difícil de explicar.
O que posso falar é um baita lugar comum. Só existia amor. O ar ficou leve. As
pessoas conversavam felizes. Quando entrou uma velhinha, dois homens se
levantaram para dar lugar.
Eu me sentia como em alguns sonhos que
já não tenho faz tempo. Nesses sonhos eu ia a uma fazenda em uma ilha. Lá não
existia medo, desconfiança ou raiva, só uma sensação de felicidade absoluta.
Era assim ali no ônibus. Quando saímos
do túnel Catumbi-Laranjeiras ele disse ao motorista que ia descer, agradeceu a
todo mundo pela conversa e pela carona. Meu coração estava disparado. Pensei em
descer, correr atrás dele e perguntar o que fazer da vida daí em diante. Nah,
sua doida, você já foi hippie faz tempo. As respostas não estão com ele.
O ônibus andou. Olhei pela janela. No
chão da pracinha, um monte de folhas e restos de legumes da feira que tinha
acabado. E carneiros. Sim, carneiros. Muitos carneiros felizes, comendo as
folhas no chão. Carneiros pastando no Catumbi. Não eram carneiros branquinhos
de foto de catecismo. Estavam com a lã bem sujinha até. Jesus tinha acabado de
virar a esquina.”