IDENTIDADE
Airton Sousa - Direto da quarentena
Dos meus tempos de morador de São Paulo, eu lembro que a primeira reação
que as pessoas tinham quando reparavam no meu sotaque era me chamar de
“carioca”, mesmo eu não tendo nascido no Rio de Janeiro - mas elas não sabiam
disso. Eu sempre fiz questão de me mostrar “um carioca legítimo fora da sua
cidade”. Assim, meu sotaque era mais chiado que o de costume, meus “s” tinham
mais som de “x” do que mesmo a maioria dos próprios cariocas que moravam lá
também. Eu fazia questão de ser carioca, de falar do “Mengo” e ressaltar as
belezas da cidade. A paulistada correspondia e me chamava de “carioca”.
Até o dia em que fui morar em Campo Grande, ali pelos lados de Santo
Amaro, na zona sul, e conheci o Paulinho, hoje meu grande amigo. Quando fui
apresentado como “carioca”, ele me olhou de cima a baixo e disse:
- Você é carioca, com essa cara de “Joãozinho Trinta”? Nunca!
Tremi. Meu segredo estava para ser descoberto... Naqueles anos todos de Sampa
nunca ninguém havia contestado a legitimidade da minha carioquice. Esse era um
segredo que eu guardava a sete chaves. Meus documentos todos nunca ficavam
visíveis. Eu fazia muita questão de ser carioca e de ser reconhecido como tal.
- Ah, eu sou carioca, sim; sou filho de nordestinos, mas nasci no Rio.
Sou carioca da gema.
Que grande bobagem!
O segredo foi descoberto, numa bela manhã de domingo. Enquanto eu estava
no banho, um amigo entrou lá em casa. E enquanto me aguardava, na sala... Eu
havia esquecido os meus documentos na mesinha e quando saí do banheiro o amigo
estava com minha carteira de identidade nas mãos e me disse:
- Quer dizer que você nasceu em Caxias, no estado do Maranhão... e esse
tempo todo “pagando” de carioca... Você é uma fraude mesmo.
Foi o fim de uma era...
Graças a Deus eu entendi que a única identidade que vale é aquela para a
qual Deus nos chamou.
E assim começamos uma nova temporada. Novos caminhos, nova vida, novos
dias, nova identidade.
“Portanto, se alguém está em Cristo, nova criatura é. As coisas antigas
já passaram; eis que surgiram coisas novas.” II Coríntios 5:17
E nunca esqueça, meu amigo, quem define você não é a sua velha
identidade comida pelo tempo, não é o lugar de onde você veio nem para onde
você vai. Quem o define não é o caráter torto, sua personalidade distorcida,
seus traços mal riscados. Quem define você é a Graça de Deus. E isto basta.
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