ENSAIO SOBRE A CEGUEIRA
Por
João Octávio Barbosa
O
que aconteceria se toda a humanidade, pessoa por pessoa, ficasse completamente
cega? Esse é o enredo do livro de José Saramago, cujo título eu usurpei para a
nossa coluna de hoje. A história também virou filme em 2009, com o diretor
Fernando Meirelles. Não vou mandar “spoilers”. Curtam que é legal.
Há
uma semana, exatamente, começou a Paralimpíada. Amanhã, a esta hora (ou um pouco mais cedo, ou um pouco mais tarde, depende de que horas são para
você agora), acontecerão as semifinais do “Futebol de 5”, masculino, competição para cegos. É aquele
esporte em que os atletas, mesmo diante de suas dificuldades físicas,
demonstram claramente o quanto nós, peladeiros de final de semana, não jogamos
nada, mesmo vendo.
Cegueira
é um problema antigo. É... exatamente. Você, que é meu leitor assíduo das
quartas-feiras, sabe que agora é hora de levar o assunto do primeiro parágrafo
para os tempos bíblicos. Jesus curou muitos doentes, lemos nos quatro
evangelhos, mas a história de “pós-milagre” mais extensa é a do nosso Perfil
Sem Curtidas de hoje. O cego de João
9. Vale uma olhada.
O
pobre ceguinho está lá, quieto, no canto dele, e ainda é obrigado a ouvir
humilhação dos discípulos. Pecador ou filho de pecador são suas opções de
rótulo. Jesus diz para não julgar e faz a cura. Controvérsia na vizinhança: É ele?
Não é ele? É incrível demais para acreditar. Os fariseus, invejosos de Jesus,
querem tirar a história a limpo e decidem interrogá-lo.
O
que os fariseus realmente desejavam era intimidar e fazer com que o cego
negasse para as multidões que tinha sido alvo de um milagre de Cristo. Eles
conseguiram assustar os pais do cego, que não queriam problema com a liderança
da sinagoga, e fizeram a Daisy. Ou seja, se fizeram de “deisentendidos”: “Procurem a nosso filho, não temos nada a ver com
isso.”. Omitiram apoio a seu filho, que eles viram nascer cego!
Os
fariseus também tentam denegrir a imagem de Jesus. Acusam-no de pecar no
sábado. Como se fazer um milagre fosse contra a santificação do sábado.
Inclusive, abrindo aqui um falso parêntese, se você é cristão e não sabe a
trina relação entre o sábado, a sua santidade e Jesus, taí um texto para você
analisar bem. O sábado de Deus era transgredido pelos fariseus ao passo que os
fariseus acusavam o “Homem-Deus”, Jesus, de transgredir o sábado deles,
fariseus.
Aos
olhos de quem não queria ver, Jesus não parecia ser de Deus. Eles pedem ao
cego, já na sua segunda entrevista, que ele classifique Jesus como pecador e
que exalte a Deus como aquele que o curou. O ex-cego já estava ficando
impaciente com a maldade dos fariseus, e passou a dar respostas tão sinceras
quanto marotas.
São
dois lindíssimos foras. Sugere que já que os fariseus estão tão interessados em
Jesus poderiam se tornar seus discípulos. E depois critica a hipocrisia deles
ao fingir que não sabem quem é Jesus. O ex-cego me sai um excelente advogado de
Cristo. Para aquele leitor que no começo do texto não dava nada por ele... “o
ceguinho, coitado...”. Malandramente, surpreendeu pela sagacidade.
E
com toda a ousadia, sabendo que estava pisando em terreno inimigo, não tem
vergonha de assumir: seu médico é, sim, da parte de Deus, pois o que fez foi um
grande milagre, recheado de bondade de amor, queiram vocês reconhecer isso ou
não!
Foi
punido. Rejeitado na sinagoga. Deve ter aumentado ainda mais a fama dele. O “bad
boy” do bairro. O incrível ex-cego que chocou a sociedade hebraica. Saiu na
capa do Meia Hora*. Até o Mestre Jesus foi atrás dele e o achou (provando que
ele estava famoso). Ele reconheceu a necessidade de Jesus. Sua cegueira física
já não era problema. Abriu os olhos espirituais também e se entregou a Jesus.
Diferente
dos fariseus.
Diferente
de você?
Pior
cego é aquele...
Não
peço que concordem, espero que reflitam!
*
Famoso tabloide carioca conhecido pelo bom humor e notícias populares.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
O que você acha?